Sobre os Quilombolas
A origem dos quilombos relaciona-se com o processo de resistência ao regime de escravidão de afrodescendentes que vigorou no Brasil por 300 anos, entre os séculos XVI e XIX. Tais grupos foram formados a partir de uma grande diversidade de processos e estratégias de resistência à opressão: as fugas com ocupação de terras livres; o recebimento de terras por herança, doação ou como pagamento de serviços prestados ao Estado; a compra de terras; ou ainda, a permanência nas áreas que ocupavam e cultivavam no interior de grandes propriedades.
A abolição da escravidão em 1888 não significou o fim de tais grupos sociais que permaneceram e resistiram em suas terras, ignorados pelo Estado brasileiro e invisíveis à sociedade. Até os dias de hoje, tais comunidades constituem grupos étnicos que compartilham de uma identidade que os distingue dos demais e que constitui a base para a sua organização, a sua mobilização e sua ação política especialmente no seu relacionamento com os demais grupos e com o Poder Público (Andrade, 2011).
As comunidades quilombolas estão distribuídas por todas as regiões do País, ocupando biomas bastante diversos. Na sua maioria, encontram-se na zona rural, mas existem também grupos localizados em área urbana. Não existe um censo da população quilombola no Brasil. O governo brasileiro estima que a sua população seja constituída por 214 mil famílias e 1,17 milhão de quilombolas (SEPPIR, 2012).
O Pará é um dos estados brasileiros que possui maior quantidade de comunidades quilombolas em seu território. Até 2015, 233 comunidades quilombolas paraenses eram reconhecidas pelo Governo Federal, por meio de certidão de autorreconhecimento expedida pela Fundação Cultural Palmares. O Pará também tem o maior número de terras quilombolas tituladas pelo Estado brasileiro, com 57 títulos expedidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (órgão do governo federal) e Instituto de Terras do Pará (órgão do governo do estado).
Os quilombolas de Guajará Mirim
“Não era uma comunidade de negros que fugiram da escravidão. Na realidade, aqui era uma fazenda onde negros e negras foram escravizados. [...] E quando a escravidão se tornou um crime, os escravocratas – porque não estava mais sendo lucrativo, ou por algum outro motivo – foram embora, e os negros ficaram aqui nas terras. [...] Depois de um tempo, vai-se incorporando negros que vinham de outras comunidades aqui mesmo da região.” José Carlos Galiza, 52 anos, liderança quilombola de Guajará Mirim, coordenador administrativo da Malungu (organização estadual que articula as associações quilombolas do Pará).
José Carlos Galiza no quilombo de Guajará Mirim. Foto: Carlos Penteado
A presença negra na região do Baixo Acará inicia-se nos séculos XVIII e XIX. Por ser uma das principais áreas de produção de cana-de-açúcar no período escravocrata, a região concentrou grande quantidade de negros escravizados, cujos descendentes ali permaneceram até os dias de hoje.
A comunidade quilombola de Guajará Mirim possui uma origem comum ao quilombo vizinho de Itancoã Miri. No final do século XIX, na região, existia uma fazenda chamada Itanquãm, propriedade do capitão Antonio Maciel de Farias, onde funcionava uma olaria. Os herdeiros deste homem, após sua morte, arrendaram partes da fazenda para os seus antigos escravos que, na falta de alternativas de subsistência em outras localidades, ali permaneceram.
Como explica Dorival Nascimento, morador da comunidade, “Eu sei que teve aqui uma colocação de diversos escravos, que quando eu me entendi, eu encontrei uma certa qualificação desses escravos, que moravam ali no Itancuã. Uma família do Aristides [...] Aristides Monteiro, e a nossa família, do meu avô, é nascimento. É a família maior que existe aqui [...]. Esse lado tudo era família de escravos. [...] Então aqui em Itancuã eles colocaram uma fábrica artesanal de barro. Fizeram muito barro daqui. Tinha uma casa grande, ela tinha dezesseis quartos. A casa de um rico. De um branco. E no meio desses quartos tinha o sumidor.” (Documentário Nós, quilombos da Amazônia).
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