Quilombo do Silêncio (Foto: Mayara Maciel)
Os quilombolas do Baixo Amazonas - Pará
Na região da Amazônia conhecida com Baixo Amazonas – ou Calha Norte do Pará - encontra-se uma grande concentração de comunidades quilombolas, um total de 70 comunidades conhecidas até o momento. Estão distribuídas pelos municípios de Oriximiná, Santarém, Monte Alegre e Alenquer e partilham uma história comum de formação a partir da resistência à escravidão.
Os escravos africanos foram trazidos ao Baixo Amazonas para servir de mão de obra nas fazendas de gado e cacau de Óbidos e Santarém a partir da segunda metade do século 18. Os historiadores acreditam que grande parte desses negros procedia do sudoeste/centro da África, predominando os da região Congo-Angolana, da etnia Bantu (Funes, 1999)
Os quilombos foram formados já nas primeiras décadas da implantação das fazendas. Os escravos fugiam pelo rio à noite, subindo para as cabeceiras dos afluentes do Rio Amazonas, buscando o alto dos rios, acima das cachoeiras que dificultavam a captura.
Os fugitivos enfrentaram a repressão dos seus senhores e das autoridades governamentais. Até a abolição da escravatura, em 1888, várias ações repressivas foram organizadas pelos senhores brancos, resultando por vezes em fuga e abandono das moradias, por vezes em captura. A ação repressiva porém não foi suficiente para aniquilar totalmente os quilombolas que resistiram até o fim da escravidão.
Vale destacar que o contato dos quilombolas com a sociedade não era marcado apenas pela repressão. Os quilombos eram também visitados por religiosos, por cientistas e por comerciantes. Durante todo o período da escravidão, os quilombolas comercializaram seus produtos agrícolas diretamente com os comerciantes nas cidades da região (como Óbidos) ou com os regatões que subiam os rios em direção aos quilombos. Os quilombolas produziam mercadorias importantes para o comércio local, como a mandioca, o tabaco, o cacau e algumas "drogas do sertão". Desta maneira, os quilombolas se inseriram nas sociedades locais, constituindo redes de solidariedade, conquistando sua autonomia e forjando uma cultura afro-amazônica através da reestruturação de sua vida sócio econômica (Funes, 1999).
Atividades Econômicas
As principais fontes de renda das famílias são a produção e comercialização de farinha de mandioca e do milho e na pesca.
“O produto que é mais feito aqui é a farinha, o beiju. O destino dela [a farinha] é para Manaus [capital do estado do Amazonas], porque aqui tem os atravessadores que compram por um preço mínimo, e o pessoal envia para Manaus, pelo barco, onde pagam o dobro pelo saco de 50 Kg”, segundo Manoel Siqueira, 37 anos, da comunidade do São José, atualmente vice tesoureiro na Acornecab.
A farinha é um produto muito consumido na região e essencial na dieta das famílias, sendo produzido na maioria dos quilombos do Baixo Amazonas desde a época das fugas e formação dos territórios quilombolas (Funes, 1996). A mandioca é plantada em roças familiares localizadas em regiões distantes da área onde estão situadas das residências.
Diversos alimentos são produzidos ou coletados pelos quilombolas para consumo próprio: verduras, babaçu, açaí, patauá, castanha do pará, pupunha, frutos (laranja, banana, melancia, jerimum, maxixe, coco, cupuaçu, limão, bacaba, manga). Muitas vezes, comercializam tais produtos e assim complementam a renda com a venda deles in natura ou com a produção de doces e geleias com os frutos. Ainda assim, lamentam os quilombolas alguns alimentos estragam pela falta de estrutura para o beneficiamento da produção.
“Quando da demais é um estrago imenso, alguns aproveitam assim, fazendo um doce da manga, para comer ou para vender. É um meio também de sobrevivência naquele período em que ela está dando, sabe. O que falta é um beneficiamento dessa fruta, para a gente guardar ela e vender, emendar um período a outro, porque a gente tinha aquela polpa fora do período que ela dá. Ai a gente acaba jogando fora aquilo que era para ser o nosso alimento no dia a dia”, explica Manoel Siqueira.