O Assentamento Dois Riachões é composto por 38 famílias, com cerca de 170 pessoas e está situada no município de Ibirapitanga-BA no território Baixo Sul da Bahia no Bioma Mata Atlântica a 380 km da capital - Salvador. A Comunidade está organizada em associação, composta por uma coordenação colegiada, representantes da executiva (presidente, secretário e tesoureiro) e setores de produção (gênero, educação, jovens, esporte, cultura e lazer).
A Associação é vinculada ao Movimento de Trabalhadores Assentados, Acampados e Quilombolas da Bahia – CETA (organização de luta pela reforma agrária e democratização da terra no Brasil). A Associação tem como objetivos: fortalecer a organização econômica, social e política dos assentados (as); estimular atividades econômicas desenvolvendo formas de cooperação que ajudem na produção e comercialização coletivas, assegurando a preservação do meio ambiente através de práticas agroecológicas; defender os direitos coletivos dos associados e associadas junto ao poder público, principalmente no atendimento das necessidades de política agrícola e agrária, educação, saúde, habitação, energia, estradas, lazer e demais políticas públicas; contribuir para a organização de movimentos voltados a assegurar a vida e dignidade humanas preservando e conservando o meio ambiente; criar condições para a politização dos associados e associadas, através de cursos, seminários e debates; e articular parcerias, entidades e movimentos de luta e defesa das classes trabalhadoras promovendo a união, solidariedade e companheirismo das famílias camponesas e trabalhadoras em geral em prol da transformação social e da democratização da estrutura agrária. Ponto de referência georreferencial (-14.200073 -39.451959).
CLASSIFICAÇÃO DO CASO
A região sul da Bahia por muito tempo foi destaque na produção de cacau. Chegou a representar 50% da balança comercial do Estado da Bahia. A família Pinto, na qual na fazenda Dois Riachões pertencia, chegou a acumular 96 fazendas de cacau. Para fugir dos encargos e vínculos empregatícios os produtores mantinham relações de meeiros[1] com os trabalhadores. Essa prática ainda é comum nessa região.
Foto: Claudio Dourado
Na fazenda a cultura do cacau (teobroma cacau-L) era predominante, com o pacote da revolução verde de forma intensa, orientado pelo seu órgão federal a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira – CEPLAC.
Devido à crise da vassoura de bruxa, em 1970, a região sul da Bahia tem um declínio na produção da cultura do cacau, mergulhando numa grande crise financeira onde cerca de 300 mil trabalhadores rurais migraram para as grandes capitais em busca de emprego. Outros tantos trabalhadores quiseram rescrever a história na região, integrando- se a inúmeros Movimentos Sociais de luta pela terra e espalhando acampamentos de lona preta a beira das estradas para adquirir um pedaço de terra para viver com dignidade. Em setembro de 2001 nasce o acampamento dois Riachões, com 56 famílias, às margens da Rodovia Estadual - BA 652, em frente da fazenda com o mesmo nome (Dois Riachões).
Foto: Claudio Dourado
A polícia apareceu no dia seguinte, com a tentativa de tirar o acampamento, mas as pessoas resistiram. No mesmo ano, o Movimento CETA solicitou a vistoria da propriedade (fazenda Dois Riachões) junto ao INCRA. Sendo vistoriada no ano de 2002, com o acompanhamento da polícia federal
Em 2003, foi decretada a ordem de manutenção de posse. Retiram as mulheres e crianças para o ginásio na cidade. No dia seguinte os proprietários da fazenda vieram para queimar os barracos, mas os camponeses que estavam em tocaia, reagiram, resistiram e retornaram logo em seguida com as famílias. Após essa ação a coordenação do CETA conseguiu um documento do DERBA – Departamento de Infraestrutura e Transporte da Bahia, alegando que a área, às margens da pista, não era particular, mas de domínio do próprio DERBA. A partir desse conflito, os proprietários colocaram pistolagem, que ficaram rondando o acampamento por mais de 05 anos. Ameaçavam com tiros, pressões psicológicas, negavam o acesso a água e provocava curto circuito na rede elétrica, com arame, para dificultar a vida dos acampados.
Durante esse tempo as famílias enfrentaram a fome e todo tipo de discriminação permanecendo até 1º maio de 2007. Essas dificuldades provocava uma oscilação no número de famílias acampadas. Avaliando a situação de precariedade e devido a morosidade do INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, as famílias decidiram ocupar o imóvel conjunto Dois Riachões de pouco mais de 413 hectares, depois de sete anos de acampamento. Os trabalhadores sem-terra encontraram uma terra destruída por veneno, a criação de gado de corte e a produção de cacau em total abandono. Após a ocupação novas famílias foram incorporadas ao grupo, na ocupação. Já dentro da Fazenda, começa a batalha judicial relacionado ao processo da Dois Riachões. O laudo do INCRA constava como área improdutiva, mas foi elaborado um contra laudo da propriedade elaborado de dentro do escritório da CEPLAC, sem sequer visitar a área.
Diante dos impasses, no ano de 2008, um perito federal fez uma visita, refazendo o laudo de vistoria, comprovando assim que a área configurava como propriedade de médio porte e improdutiva. Diante de tantos conflitos, no mesmo ano, as famílias organizaram vigílias de frente ao portão, que se mantem durante três anos, e contrata uma empresa particular SERTOP – Serviços Topográficos LTDA para divisão dos lotes de cacau, realizado com recursos próprio dos camponeses/as.
Em 2011, o ouvidor agrário nacional – Gercino reuniu com as lideranças da área e do Movimento. Os ocupantes recebem a visita da Companhia Independente de Polícia Militar (específica para conflitos agrários) em 2012, e posteriormente do capitão da Polícia Militar da Bahia para o comprimento da reintegração de posse. A ação não efetivou.
Em 2017, acontece o julgamento final do processo administrativo da Dois Riachões, o Acordão - Julgamento improcedente a ação possessória de reintegração de posse e a desapropriação pelo TRF/1 – Tribunal Regional Federal de Primeira Região, o julgamento improcedente do relator do processo de desapropriação da dois Riachões, a decisão do Supremo Tribunal de Justiça acatando o acórdão proferido pelo TRF/1. Em Seguida (2018) foi emitida a Imissão de posse da Dois Riachões.
Com todas decisões favoráveis, os assentados aguardam, do INCRA, a legitimação dos procedimentos topográficos e as políticas de infraestrutura e créditos.
[1] Contrato de parceria agrícola, Art. 96. Estatuto da Terra. Decreto – 59.566/1966.