“Antes, nem documento ninguém tinha lá dentro, depois que todo mundo foi reconhecido e documentado, aí todo mundo entendeu, principalmente eu, que nós temos nossos direitos, nós temos que correr atrás e lutar por nossos direitos”: Raimundo Belmiro, morador de Resex na Terra do Meio.
A partir da década de 1970, a população local ficou totalmente excluída do projeto de desenvolvimento regional. Muitos migraram das beiras de rios para as cidades, principalmente Altamira, o maior centro urbano de toda a região. Isso também decorria do fato de que já estava ocorrendo uma queda nos preços dos produtos extrativistas, o que causava um esvaziamento nos seringais e a falência da maioria dos seringalistas.
Quem acabou ficando foi a população que nascera naquela região, que se moldou àquela região, que desenvolveu formas adaptativas àquele ambiente e que conviveu com os povos indígenas nessa adaptação a uma região totalmente diferente daquelas de onde vinha.
Essa população também não tinha nenhuma profissionalização e a única possibilidade de sobrevivência era a de continuar a ser extrativista em uma região muito rica em termos de recursos naturais - o que fazia a sobrevivência possível (...).
A preocupação em relação à proteção e conservação da região do Médio Xingu originou-se da iniciativa de 114 entidades que integram o Movimento pelo Desenvolvimento da Transamazônica e Xingu (MDTX), como parte da proposta apresentada ao governo federal visando o ordenamento territorial e o desenvolvimento sustentável da região.
O processo havia sido iniciado em 1997 com o Grito da Terra, quando as entidades locais clamavam pelo ordenamento fundiário da região e pediam que a Terra do Meio fosse destinada para a criação de Unidades de Conservação em uma lógica de proteção da região. Então o Ministério do Meio Ambiente (MMA) assume o compromisso de realizar o estudo para a destinação destas áreas e começa a procurar instituições para conduzi-lo.
O Instituto Socioambiental (ISA), a Fundação Viver, Produzir e Preservar (FVPP) e o Instituto de Pesquisas da Amazônia (IPAM), junto com os movimentos locais, apresentaram a proposta ao governo no ano 2000, mas ela ficou engavetada até o início do governo Lula, quando Marina Silva assumiu o ministério e a proposta foi reapresentada.
Também contou para o andamento do processo mais um episódio violento do conflito social na região. Em agosto 2001, uma das principais lideranças do MDTX, Ademir Federicci, o Dema, foi assassinado diante de sua família por pistoleiros. O movimento lutava contra a grilagem de terras e a construção de hidrelétricas nos rios amazônicos, além de melhorias das condições de vida da população local. A morte de Ademir inspirou grande comoção na edição daquele ano do evento “Grito da Terra” e fortaleceu a mobilização das organizações locais pela criação de unidades de conservação na Terra do Meio.
O movimento social da região foi formado por gente que foi trabalhar nos empreendimentos agropecuários abertos a partir dos anos setenta na região, e que migrou do Sul do Brasil como colonos, sem nenhuma intimidade com a economia extrativista regional. A principal organização na região é a Fundação Viver, Produzir e Preservar, que de certo modo é a ONG do movimento social regional, reunindo sindicatos de trabalhadores rurais, entre outras entidades.
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O movimento sediado na cidade de Altamira sempre teve uma visão clara do que precisava ocorrer na Terra do Meio, mesmo que não tivesse na projeção deles a clareza de que os colonos fossem ocupar aquela área. Era mais no sentido de criar um cinturão verde. A ideia é criar uma estratégia de sustentabilidade para a região, não apenas focada na economia extrativista, mas também na preservação ambiental.
As duas maiores UCs da região – a Esec da Terra do Meio, com 3,3 milhões de hectares, e o Parna da Serra do Pardo, com 445 mil hectares – foram decretadas, em 17 de fevereiro de 2005, como parte de um grande pacote ambiental que serviu como resposta do governo federal à série de assassinatos de trabalhadores rurais e líderes do movimento social do Pará, principalmente à morte da freira norte-americana Dorothy Stang, ocorrida alguns dias antes, em Anapu, uma das cidades da região.